...e da Serra se fez Pão

I – BROA DE LORIGA – IDENTIDADE E RELEVÃNCIA

A Broa de Loriga é um pão de milho branco com largas tradições, profundamente enraizado na história local.

Foi consumido praticamente em exclusivo por mais de dois séculos, num contexto de actividade industrial crescente e intensiva. A Broa constitui-se pilar forte de sustentação até meados do século XX.

Os operários, população dominante, acumulavam com a sua actividade na indústria o cultivo do milho.

A confecção da Broa foi durante um longo período uma tarefa praticada com empenho por todos, reforçada pela utilização partilhada dos fornos de lenha.


II – AS ORIGENS: VISÃO E ENGENHO

Milho

A Broa de Loriga está na origem de uma profunda intervenção na paisagem.

A descoberta do milho, trazido pelos Descobrimentos, abriu novos horizontes de subsistência.

E… aconteceu a “revolução do milho” (Orlando Ribeiro), engenhosa organização do solo e das águas para permitir o cultivo do milho em regadio.

A partir do século XVIII, através de um esforço monumental, por profundos arroteamentos e movimentação de terras, foram moldadas em Socalcos as encostas da montanha, disciplinados os cursos de água provenientes dos cumes da Serra, das lagoas e covões de antigos glaciares, conquistadas várias fatias de terra arável às Ribeiras.

Foi construído um assinalável património, composto de inúmeras plataformas mais ou menos planas – os socalcos – de solo profundo e fértil, sobrepostos uns aos outros em escadaria. Dispostos linearmente, acompanham o percurso das linhas de água incorporando uma sistematização hidrológica exemplar.

Sustentados em cerca de 40 km de grandiosos muros de pedra com alturas médias entre 4 a 6 metros – os “combaros”- foram feitos de pedra solta e protegidos das águas de escorrência das vertentes por meio de diques, também de pedra solta.

A água proveniente dos pontos mais altos da montanha tornou-se muito valiosa.

Os cursos de água foram objecto de intervenção, sendo desviado o leito da ribeira para conquista de terra de aluvião, construídos açudes, represas e levadas, canais que nalguns casos se estendem por dezenas quilómetros, e toda uma estrutura para permitir os moinhos movidos pela força da água.



III – CICLO DO MILHO À BROA, AS PRÁTICAS

O cultivo do milho

E o cultivo do milho começou, marcado pela morfologia do solo em socalcos.

Em Março e Abril os campos são preparados para a sementeira do milho em Maio.

O cultivo prossegue com o atupir, tarefa de cobrir com terra a semente acabada de semear.

Segue-se o necessário assentar- as primeiras regas acompanhadas pela distribuição de “sarrasco” (uma palha abundante na serra) por toda a área cultivada, para prevenir a fuga da terra para as partes baixas dos socalcos devido ao declive acentuado.

Com o milho já crescido, para fortalecer as espigas, procede-se ao escanar do milho pelo corte das folhas mais baixas. Também a bandola, a parte mais alta do pé de milho, é cortada com o mesmo objectivo.

As espigas são por fim colhidas e o escamisar do milho (desfolhada) ocorre com rituais próprios, cantigas e folias.

O final do Verão trás o debulhar do milho, tradicionalmente com o “mangual” e o estender do grão nas eiras sobre toldos ou mantas de fitas.

Antes da armazenagem ergue-se o milho com ajuda de peneiras, que se enchem de grãos e levantando-as à altura da cabeça, deixam-se cair lentamente, para que o vento leve algumas impurezas que possam estar no meio dos mesmos.

Mede-se em alqueires e é colocado em sacas ou em tulhas. No primeiro caso, o milho é encaminhado logo para os moinhos onde, pela força motriz da água das ribeiras, é transformado em farinha.


A confecção da Broa

Farinha de milho, sal, massa velha (fermento) e água são os ingredientes que energicamente ligados em “masseiras” de madeira e após processo de levedação, irão transformar-se na massa que será Broa.

Tradicionalmente para que a massa fosse abençoada e crescesse bastante enquanto levedava, fazia-se uma cruz na sua superfície e entoavam-se “rezas”.

Com a ajuda de um recipiente, normalmente de barro ou lata, são talhadas bolas de massa e “bailadas” a preceito para atingir o formato de broa, de seguida cozidas em forno de lenha.

No passado os fornos eram partilhados por toda a população e por esse facto, as bolas de massa eram identificadas com sinais para se saber a quem pertenciam (nº de “beliscos” ou de buracos, ou até com objectos metálicos espetados na massa)



IV – “FERMENTO” DE FUTURO
Hoje a Broa de Loriga perdura em termos de sabor desejado e partilhado por várias gerações, propulsor de vida, teia de ligações e afectos

• Alimenta uma das principais indústrias de Loriga

• É levada para os “4 cantos do mundo” por onde se espalham Loriguenses

• Dá o mote à criatividade da restauração local numa saborosa oferta gastronómica
A Broa de Loriga mantem-se também em memórias e lições de engenho do passado, que se procura relevar no presente enquanto “fermento” de futuro


• Rota da Broa de Loriga
Oferta aos visitantes de um conjunto de percursos pedestres, desenhados para, num especial contacto com a natureza, dar a conhecer o universo rico de experiências e tradições da Broa de Loriga.


• Loriga, Sabores de Sempre
Registo em livro de um património imaterial de saberes, onde a Broa de Loriga se destaca.


• Confraria da Broa e do Bolo Negro de Loriga
A Broa de Loriga e os valores que encerra são pilares constitutivos desta entidade, sendo fonte inspiradora de intervenção virada para a construção de um futuro em que continue a haver “Pão” em Loriga.



Dezembro 2011 CONFRARIA DA BROA E DO BOLO NEGRO DE LORIGA