Emigração

Emigração Loriguense

Os portugueses estão entre os europeus que mais procuraram o Brasil por razões económicas e sociais por um largo período compreendido entre 1820 e 1963.

Este surto imigratório registou  um pico em 1850 que esteve relacionado com as leis que proibiam o comércio de escravos subscritas pelo Brasil as quais tiveram impactos diversos em diferentes regiões do Brasil.

Na época, a região de São Paulo passava por um processo de crescimento económico, ligado à expansão do cultivo de café e, por isso, precisava de aumentar a contratação de  mão de obra. Pelo contrário, outras regiões, como o Nordeste, enfrentavam retração económica, e foram obrigadas a dispensar trabalhadores.

Uma tal situação provocou um fenómeno de substituição do comércio internacional de escravos por um comércio interprovincial, mais doméstico, causando a venda de escravos nordestinos destinados às terras  do Sudeste. Esta força de trabalho tinha temporariamente resolvido o problema em São Paulo, nas áreas de plantio de café.

No entanto, em 1870, a elite paulista percebeu que os fazendeiros do Nordeste estavam, de facto, a obter uma compensação financeira pelos seus escravos, ou, na prática, uma abolição mas com lucro . Surgiu o medo de uma situação comparável à dos Estados Unidos, com a divisão do país em províncias livres e províncias de escravos e os políticos paulistas começaram a buscar medidas contra o tráfico interprovincial.   

No início dos anos 70 do século XIX, a alternativa do comércio interprovincial estava exaurida, enquanto a procura de mão-de-obra nas plantações de café continuou. Assim, a oligarquia paulista procurou atrair novos trabalhadores do exterior, ao aprovar uma legislação provincial e pressionando o Governo Imperial.

Dom Pedro II , o monarca brasileiro, era um homem instruído e cosmopolita, que abominava a escravidão  (que acabou por decreto imperial em 1888, a celebrada Lei Áurea da Princesa Isabel ) mostrava-se favorável à vinda de emigrantes europeus que se constituíssem numa substituição mais moderna à mão de obra escrava.

Foi nessa conjuntura internacional e interna que centenas de milhares de Portugueses imigraram para o Brasil. A maioria deles eram camponeses das zonas rurais de Portugal, seguem acompanhados das famílias estabelecendo-se, principalmente, nos centros urbanos de  São Paulo e Rio de Janeiro, na área do pequeno comércio.

Os primeiros imigrantes e seus descendentes foram rápidos em organizar-se e estabelecerem instituições de ajuda mútua , hospitais (por exemplo, Beneficência Portuguesa), bibliotecas (por exemplo, o Real Gabinete Português de Leitura), jornais, revistas e até equipas de futebol, incluindo o Clube de Regatas Vasco da Gama no Rio de Janeiro e a Associação Portuguesa de Desportos em São Paulo.

Os Loriguenses na segunda metade do século XIX, partiam da cidade do Porto. A viagem demorava quase 2 meses e uma só visita a terra, a Madeira. A sobrevivência a bordo era assegurada por uma sopa, uma papa enfarinhada e pouco mais, segundo relatos da altura. Chegando ao Rio de Janeiro, eram encaminhados para a alfândega e distribuídos em pequenos ‘guetos’ por nacionalidade, os ‘cortiços’, onde fazendeiros e empresários com falta de mão-de-obra os iam buscar.

 

 

Preparados para o pior, dirigiram-se para o Norte do Brasil em busca de ouro, madeira, diamantes e uma vida melhor. Manaus surgia do nada no meio da selva e Belém do Pará, parecia ser uma das cidades mais ‘aportuguesadas’ da época. Diversos estudos revelaram ter havido um constante movimento migratório de portugueses para a Amazónia e Belém do Pará desde o século XVI, o qual aumentou no século XVIII.

Após a Independência prosseguiu o fluxo migratório, tendo atingido a sua máxima dimensão entre 1901 e 1930. Esta emigração manteve-se muito elevada até finais dos anos 50 do século XX, quando cessou quase completamente. Primeiro um ou dois chegavam, espalhavam-se as novidades e logo outros vinham atrás. Contam-se pelos dedos da mão os que regressaram, mas também se conta que nenhum esqueceu a sua terra e que todos unidos contribuíram pública ou anonimamente para a sua terra, construindo as famosas fontes ou ajudando a família. Hoje, a comunidade loriguense no Brasil está fundamentalmente concentrada na cidade de Belém do Pará e é conhecida pela sua fraternidade, amizade e união, celebrando em conjunto a Festa da Nossa Senhora da Guia e partilhando costumes e tradições.

Mas regista-se em Portugal outro surto emigratório que ocorre a partir de finais dos anos 50, e se dirige para a Europa: França, Alemanha, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Suíça, etc. O impacto desta movimentação será tão forte que abala toda a sociedade portuguesa. Em menos de dez anos, imigram para a França, por exemplo, mais de um milhão portugueses.

A grande emigração para França é algo relativamente recente, não tem 60 anos, altura em que cerca de 1,5 milhão de portugueses emigraram para aquele país. A emigração de portugueses para França entre 1961e 1974, é um dos episódios mais impressionantes da história contemporânea de Portugal, constituindo uma verdadeira debandada do país. Em 1990, estavam registadas em França um total de 798.837 pessoas de origem portuguesa (603 686 mil haviam nascido em Portugal e 195 151 em França).

A emigração portuguesa, apesar de todos os entraves continuou até aos nossos dias, embora numa dimensão mais modesta, assumindo agora um carácter temporário, e cada vez mais ligada a investimentos económicos, realização de estudos, actividades profissionais, tradição, etc.

Em Portugal e particularmente em Loriga, há sempre um regresso no Verão, num reencontro com a família, os amigos, os gostos e as tradições. Os que cá estão esperam sempre revê-los com saúde e alegria, por muitos e muitos anos.
 
(Bibliografia : Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura – 1995, Editora Verbo AA.VV. — A Emigração Portuguesa no Mundo, Revista História 9, 1986. AA.VV. — Migrants de la deuxième génération, Symposium, Centre Européen Culturel de Delphes, Athènes 1980.ALMEIDA, Carlos C — Movimentos migratórios, espaços socioculturais e processos de aculturação, Análise Social 42-43 (11), 1975, pp. 203-212.ALMEIDA, J. C. Ferreira de — A emigração portuguesa para França: alguns aspectos quantitativos, Análise Social 7-8 (2), 1964, pp. 599-622.ALMEIDA, Miguel Vale — Um Mar da Cor da Terra, Raça, Política e Cultura de Identidade, Celta, Oeiras 2000ALVES, Jorge Fernandes — Ler, escrever e contar na emigração oitocentista, Revista de História das Ideias 20 — O Livro e a Leitura, Fac. de Letras da Univ. de Coimbra/IHTI, Coimbra 1999. AMARO, Rogério Roque — Reestruturações demográficas, económicas e socioculturais em curso na sociedade portuguesa: o caso dos emigrantes regressados, Análise Social 87-88-89 (21), 1985, pp. 605-677.- ANTUNES, M. L. Marinho — Migrações, mobilidade social e identidade cultural: factos e hipóteses, Análise Social 65 (17), 1981, pp. 17-27. ARROTEIA, Jorge Carvalho — A emigração portuguesa — suas origens e distribuição, ICALP, Lisboa 1983.)

 
 
As Fontes da Saudade

Uma água transparente, fresca e revigorante corre nas ribeiras que ladeiam Loriga e igualmente escondida por baixo do maciço central da Serra da Estrela. Uma água que apenas se obtinha, antes do Século XX, indo buscá-la às pontes ou aproveitando-a das levadas que serpenteiam a vila.

No final do Século XIX, com o fim da escravatura e falta de mão-de-obra no Brasil, perante as adversidades de Portugal, uma Beira apelidada de “Trágica” – onde pequenos morgados tentavam sobreviver na ruralidade e onde o povo procurava viver de uma indústria rudimentar, alvo de constantes ataques de salteadores esfomeados -, encontra o motivo para uma emigração em massa para um país onde uma vida nova com esperança, sonho e riqueza podia surgir.

Assim, homens, jovens e crianças deixaram a família, os montes e as ribeiras levando, muitas vezes, apenas a roupa do corpo e um enorme sonho, sem certeza do regresso ou da sobrevivência. Eram meses de mar, de fome e desespero de chegar a um porto de abrigo.

No Brasil, chegaram de início ao Rio de Janeiro e em São Paulo instalados em cortiços, trabalharam no café, depois migraram na maioria para Manaus e Belém do Pará.

Os loriguenses, cresceram no amor e na saudade da sua terra, motores nas horas de esforço e desalento. Os miúdos ajudavam principalmente em padarias, biscastes e nas vendas do comércio. Os homens, todos os maiores de catorze anos, enfiavam-se na floresta da Amazónia. Cortavam madeiras, seringavam, abriam estradas, arrastavam pedras e morriam como formigas de febre amarela e outros males.

Na segunda metade do século XIX, começaram a partir as mulheres em busca dos maridos, muitas delas casadas por procuração com os namorados que tinham visto em criança.

As três maiores fontes de Loriga, a “Fonte das Almas”, a “Fonte do Adro” e a “Fonte do Porto”, obra do loriguense e pedreiro “Ruas”, são o resultado de uma esforçada poupança dos “loriguenses do Brasil” que, contra pestes e tormentas, arduamente desempenhando várias profissões, não esqueceram as suas origens e unidos contribuiram para que a sua terra, rodeada de ribeiras, tivesse uma das melhores redes de abastecimento de água. O povo pelo povo.

No resto do país, existem vários fontanários fruto de circunstâncias políticas mas, em Loriga, são apenas uma demonstração de amor dos que partiram aos que ficaram.

JC